Texto adaptado
O sono é extremamente importante para o organismo. A hora do sono é um momento essencial para o nosso corpo e mente e sua importância não deve ser menosprezada. Tanto que uma boa qualidade do sono está ligada a um menor risco de insuficiência cardíaca, segundo novo estudo americano publicado pela revista Circulation, da American Heart Association, Estudos comprovam ainda que pessoas que praticam exercício físico se beneficiam da boa qualidade do sono para a recuperação e melhora muscular.
O estudo norte-americano teve como objetivo analisar “a relação entre padrões de sono saudáveis e risco de insuficiência cardíaca”. Na avaliação, 408 mil participantes entre 37 a 73 anos foram acompanhados durante 10 anos. Foi constatado que 5.221 pessoas apresentaram o quadro de insuficiência cardíaca.
O estudo detectou que, depois de avaliar casos de diabetes, hipertensão, uso de medicamentos, variações genéticas e outras covariáveis, “os participantes com o padrão de sono mais saudável tiveram uma redução de 42% no risco de insuficiência cardíaca em comparação com pessoas com um padrão de sono não saudável”.
Mas por que tudo isso acontece? O que acontece no corpo quando você dorme?
Quando o sono começa a se tornar um verdadeiro pesadelo, lentamente aparecem sinais. Geralmente, isso se torna mais detectável ao longo do dia, sobretudo ao acordar com mau humor frequente, perda de memória e indisposição. De acordo com Andersen, a má qualidade do sono resulta em uma série de problemas, afetando o bem-estar físico e psicológico. E cita algumas consequências:
- Sonolência diurna
- Perda de memória
- Irritabilidade
- Ganho de peso
- Ansiedade
- Depressão
- Queda na libido
- Maior risco de acidentes
- Enfraquecimento da imunidade
- Hipertensão
- Problemas cardiovasculares
E como saber se estamos dormindo mal? Há sinais claros, como os abaixo:
- Insônia constante
- Ronco
- Sonolência no período diurno
– Ronco isolado é uma condição que não necessariamente é preocupante, mas se associado à apneia obstrutiva do sono, aí sim passa ser distúrbio de sono que pode levar o indivíduo a ter várias comorbidades – explica Andersen.
Um dos riscos quando não existe uma boa qualidade no sono é o surgimento de problemas cardiovasculares. Como apresentado no estudo, o nosso organismo está mais suscetível a apresentar determinadas doenças pela ausência de hábitos saudáveis ao dormir. Isso não deve ser menosprezado, sobretudo para quem está em grupos de riscos, como obesos e hipertensos.
– Não ter uma boa noite de sono e qualidade de vida, nem dormir o tempo necessário, vai acabar promovendo o aumento de peso, aumento da pressão arterial e insuficiência cardíaca. Quando a pessoa não dorme o tempo que deveria, prejudica a libido, ela perde força, ganha peso, ao trocar músculo por gordura. Tudo isso é muito ruim, além dos problemas de humor, como depressão – relata Mello.
Uma boa noite de sono auxilia no sistema imunológico e no humor — Foto: Moyo Studio/Getty Images
Para começar, o professor de educação física da UFMG, Marcos Tulio de Mello, representante da área de Fadiga e Acidentes na Associação Brasileira do Sono, e a médica especialista em endocrinologia e metabologia pela UNIFESP, Nara Nóbrega, apontam algumas funções do sono.
O sono auxilia no:
- Metabolismo
- Aprendizagem e memória
- Humor e motivação
- Recuperação muscular
- Sistema imune
- Saciedade e apetite
- Metabolismo de glicose
- Metabolismo lipídico (de colesterol)
- Regulação da pressão arterial
- Sistema imunológico
- Comportamento alimentar
- Massa muscular
Hormônios produzidos durante o sono
Um estudo pulicado no Journal of the American Medical Association, em 2011, revela que indivíduos que tiveram apenas cinco horas de sono ao longo de sete noites tiveram uma redução de 10 a 15% na produção de testosterona. Diversos hormônios são secretados durante o sono. O professor Marcos explica como funciona cada um deles:
- Testosterona e hormônio do crescimento GH: atuam na manutenção, aumento ou perda de massa magra e síntese proteica, auxiliando ainda em lesões musculares;
- Cortisol: atua na regeneração muscular e na parte cognitiva;
- IGF-1: sua produção é importante para a regulação da sensibilidade à insulina (quanto menos, menor sensibilidade à insulina). Atua na memória;
- Esfingolipídios: atuam na inflamação e na desordem metabólica, que aumentam quando há prejuízo ou secreção menor desse hormônio, o que ocorre com privação crônica de sono;
- TLR 4 e TLF Alfa: também secretados no sono, são importantes, já que quanto menos, maior a propensão para infecções;
- Receptores de insulina, o IL-6: atuam na regulação neuronal;
- Melatonina: age muito na indução do sono e melhora a parte imunológica.
Fases do sono
Nosso cérebro permanece extremamente ativo enquanto dormimos. Vários hormônios e neurotransmissores são produzidos e regulam com maestria o ciclo do sono, fundamental para o bom funcionamento físico e mental do corpo. Nara explica que o ciclo do sono é dividido em quatro fases, que também são dividas em fases REM e não-REM, podendo ocorrer por volta de quatro a seis ciclos das quatro fases em cada noite de sono.
- Fase 1: sonolência, o mais superficial;
- Fase 2: sono mais leve;
- Fase 3: sono profundo, sono de ondas lentas ou sono delta, devido a frequência da atividade cerebral observada nesse estágio;
- Fase REM: sono mais profundo.
Uma boa noite de sono auxilia na recuperação muscular — Foto: Istock Getty Images
– Não é incomum, inclusive, que o indivíduo desperte ao fim de um ciclo antes de iniciar o próximo. A melatonina é o hormônio que começa a ser produzido ao escurecer, sinalizando alterações físicas, mentais e comportamentais que induzem ao relaxamento. Atinge sua produção máxima durante o sono, levando a um sono de boa qualidade – acrescentou a endocrinologista.
A melatonina é inibida pela exposição à luz (solar ou artificial), reduzindo sua ação ao amanhecer e dando lugar ao pico de cortisol, hormônio estimulado pela luz e que, juntamente com outros neurotransmissores como norepinefrina, adrenalina e a histamina, é responsável pelo encerramento do ciclo do sono e por nos deixar acordados e alertas.
O que acontece a cada momento do sono
1. Na primeira hora do sono
– Nosso cérebro inicia um processo de redução da velocidade de ondas. A atividade cerebral passa por um padrão de ondas lentas, nessa fase, a frequência cardíaca reduz, a musculatura relaxa e a produção de melatonina é crescente – explica o médico do sono João Carlos de Jesus.
2. Com cerca de 2 horas de sono
– Primeiro momento de sono REM, fase em que ocorre um relaxamento total da musculatura. E o cérebro tem um padrão de atividade rápida, quase semelhante a vigília. Ele faz uma descarga elétrica e é o momento em que de fato há uma renovação dos neurônios. Se formos despertados nesse momento, nós nos lembraremos de algumas figuras, imagens, sensações, sons, que a partir daí interpretaremos como sonho, mas os estímulos que vem são decorrentes do que vivenciamos durante o dia – explicou.
3. No meio da noite
– Voltamos a ter um padrão de sono de ondas lentas e novamente por volta de 6h de sono teremos uma segunda fase de sono REM. Entre 5h e 6h de sono, o sono REM vai ter um período de 1 a 2h. Durante esse segundo sono REM, teremos um momento de regeneração e recuperação após um dia de atividade, tanto cerebral quanto físico. Por isso é importante termos uma noite de sono completa, sem interrupções, para que possamos alcançar o equilíbrio do corpo e cérebro – alertou.
4. No final do período de sono
– Teremos o inicio da produção do cortisol, que é dado pelo ciclo circadiano, baseado na luminosidade. Desde criança adquirimos esse ritmo a partir da exposição à luz solar. O cortisol, também chamado de hormônio do dia, passa a ser produzido na fase final do sono e vai levar ao nosso despertar. Naturalmente cada pessoa vai ter uma duração de tempo ideal de sono. Não é regra que sejam 8h. Os chamados dormidores curtos podem se sentir recuperados com menos horas de sono, e vice versa com os dormidores longos – explicou.
O médico ressalta ainda que a rotina social, muitas vezes, não permite que tenhamos um sono à vontade. Habitualmente temos um despertador, e se ele coincidir com o REM, teremos relatos comuns de sonhos. O tempo de 8h de sono decorre de uma interpretação média, mas o especialista afirma que não devemos nos apegar a esse número. De acordo com Marcos Tulio, existem três principais fases para promover algumas funções.
1. Fixação de memória e cognição
Sono REM: durante essa fase, desliga-se a musculatura, aumenta-se a frequência cardíaca e a pressão arterial cerebral e você vai organizar todo um processo de restabelecimento cognitivo. É nesse momento que o indivíduo vai consolidar a memória e que vai descartá-la. Bebida alcóolica e estresse muito grande fazem com que essa fase seja pulada. Por isso, quando as pessoas bebem, acordam no dia seguinte com memória ruim.
2. Relaxamento:
Estágio 3/DELTA: há a liberação de hormônios que ajudam na recuperação muscular, como o cortisol e GH. Se o relaxamento é muscular, o delta é extremamente importante. E automaticamente depois que foi estabelecido o relaxamento, o REM vai fazer com que o indivíduo restaure a cognição para que no dia seguinte se tenha vitalidade.
De acordo com a endocrinologista Nara Nóbrega, os neurotransmissores GABA e adenosina também são fundamentais para promover o relaxamento e estão presentes durante toda a noite de sono.
3. Desempenho esportivo e recuperação muscular:
Estágio 3/DELTA: há a liberação de hormônios que ajudam na recuperação muscular, como o cortisol e GH. Estudos mostram que atletas que dormem mal são os que mais se lesionam, ou que demoram mais para se recuperar. Além disso, para a parte de atenção e concentração também é importante entrar no sono REM. Por exemplo, ao escutar um apito, ou executar uma estratégia e etc.
4. Crescimento de crianças e adolescentes:
Sono REM: nessa fase, é secretado o hormônio do crescimento, ou somatropina, responsável por estimular o crescimento longitudinal em crianças, mas fundamental para o crescimento celular e reparo de danos celulares em geral, já que aumenta a produção de proteínas necessárias para estes processos. É também por isso que se diz que atletas precisam de uma boa noite de sono para a recuperação muscular.
– O que mais atrapalha a qualidade de sono hoje em dia é o excesso de exposição a telas, e a sensação de tudo ser urgente, gerando ansiedade, dificuldade de desconectar e mentes que literalmente “não desligam” – alerta Nara.
– Devido a emissão de luz na faixa azul e branco, o que poderia afetar o hormônio e retardar o sono, o uso de tablets e laptops horas antes de dormir pode suprimir a produção de melatonina – completa Tulio.
10 dicas para ter hábitos saudáveis de sono
- Tente dormir e acordar no mesmo horário, busque estabelecer uma rotina regular;
- Não fique exposto à luz no período da noite, ainda mais cercado de aparelhos móveis ao lado da cama. Afaste-se de celulares e computadores uma hora antes de dormir e desligue a televisão ao deitar;
- Mantenha um ambiente favorável ao sono;
- Crie o costume de relaxar à noite;
- Não fique pensando em problemas;
- Não coma muito antes de dormir, sobretudo alimentos ricos em carboidratos;
- Evite café, bebidas alcoólicas e estimulantes próximos a hora do sono;
- Não durma muito tarde;
- Se sentir problemas, procure um médico especialista em sono;
- Faça exercícios físicos regularmente.
Fontes:
Nara Nóbrega: Médica especialista em Endocrinologia e Metabologia pela UNIFESP e Nutrologia pelo Hospital Albert Einstein, membro do Corpo clínico da Clínica De Fina em São Paulo.
Marcos Tulio de Mello: professor titular da UFMG, representante das áreas de Educação Física, e Fadiga e Acidentes na Associação Brasileira do Sono.
João Carlos de Jesus: graduado em medicina pela Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas, a FCM-UNICAMP. Especializado em Clínica Médica e Pneumologia pela mesma instituição. Capacitou-se em distúrbios respiratórios do sono no Instituto do Sono de São Paulo.
site: ge.globo.com/eu-atleta